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Sobre duas rodas (ou nenhuma)

Prestes a me livrar do meu carro, comprado em infinitas prestações de um valor que eu não podia pagar, porque julguei necessário em um determinado momento da minha vida pra atender às pressões do mundo que anda a 100 km/h. Por quatro anos usufruí do (suposto) direito de ir e vir que o carro proporciona. 50 mil quilômetros rodados. Feliz da vida, vendo o pretinho básico, como costumava chamá-lo, por cerca de 40% do valor que paguei. Números que não significam mais nada pra mim.
Há dois anos comprei uma bicicleta e venho experimentando em doses homeopáticas o aparente desafio de viver sem ter um carro na garagem à disposição 24 horas por dia.
Você perde algumas coisas: não dá pra ir ao supermercado preferido sempre, não dá pra viajar pra qualquer lugar a qualquer hora. Você ganha muitas coisas: o prazer de voar, nem que seja só aos domingos, sobre as duas rodas da magrela; as horas de leitura e descanso entre uma cidade e outra sem precisar dirigir; uma dose extra de saúde, bom humor e impagáveis cenas cotidianas que vêm com as caminhadas até o mercado/banco/restaurante mais próximo; um pouco mais de disciplina, porque tem que se planejar pro horário do ônibus ou da carona; etc. Não consegui encontrar mais que duas desvantagens; não consegui enumerar as vantagens. Valeu a pena, e por isso me desmotorizo numa boa.
http://www.lafrancebis.com/velo.html

Pra quem gosta de cifrões, asseguro que alugar um carro ou pegar um táxi quando realmente não há alternativa às quatro rodas sai muito mais barato. Pegue sua calculadora e go ahead.
Pra quem se sente poderoso dentro de um automóvel, restam minhas lástimas. O possante mais tira do que dá liberdade. Você vai pro bar beber com os amigos de carro porque tem carro, e sente que pagar por um táxi é como pagar duas vezes pelo mesmo produto. Afinal, você já tem um carro. Você perde a liberdade de escolher se é mais conveniente ir a pé, pegar um ônibus, uma bike, uma carona, porque o carro te leva a todos os lugares, então ele parece ser sempre a única opção.
E se contabilizarmos as vantagens coletivas, aí sim o carro perde a majestade. Porque a única coisa que os outros podem ganhar quando você usa um carro é uma carona, e isso, a gente sabe, é ponto fora da curva. A regra é cada um no seu carro, mesmo que indo pra mais ou menos o mesmo lugar mais ou menos na mesma hora.
48 horas pra ver minha garagem vazia de vez. E ajustar a velocidade da minha vida.

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